“Os santos mantêm os olhos fixos em Deus. Permanecem fiéis,
e é por isso que são santos, não por serem invariavelmente modelos de conduta
polida ou mesmo imitável”. Donald Spoto
Geralmente, as pessoas se esquecem que os santos , antes de
serem santos, eram homens e mulheres.
Eram pessoas comuns que fizeram coisas extraordinárias. Mas passaram pelas mesmas coisas que nós,
tiveram que viver neste mesmo mundo complicado – cheio de doses desiguais de
amargura e beleza. Quase todos foram
considerados loucos pelos seus contemporâneos.
O que diríamos de São Francisco nos dias de hoje? Um maluco
beleza? Um esquizofrênico ? Um pai mais paranoico não internaria esse
rapaz numa clínica para viciados? Ou
quem sabe levaria para um tratamento espiritual. Imagine ter um filho que decidiu largar o
dinheiro e o conforto para abraçar a
missão de reconstruir uma igrejinha em ruínas.
Em 2013, quem seria Francisco? Você conversaria com ele? Aceitaria que ele prestasse algum serviço na
sua casa, em troca de um prato de comida?
Pois era isso que ele fazia.
Vivia com o mínimo, trabalhando pelo sustento de cada dia. Vendia o almoço para comprar a janta, como dizemos.
Não me espantaria que um Francisco nascido hoje tomasse do
Francisco de Assis o título de santo dos animais. Atualmente, um homem com a proposta de vida
de São Francisco só teria mesmo os animais com quem conversar. A nossa sociedade viraria as costas para ele
de forma muito mais radical – oprimidos que estamos pelo medo da violência, da
pobreza, da diferença...
Francisco de Assis também tratava dos leprosos. Certa vez, uma repórter com quem trabalhei se
recusou a fazer uma matéria com uma família de leprosos. Ela alegou que tinha filhos e não queria
pegar a doença. Sim. Acredite. Uma jornalista do século XXI reproduziu todo o
ódio, ignorância e intolerância que eu julgava sepultados há séculos. Era 23 de dezembro e nunca me doeu tanto uma
matéria não feita. Aquela mulher ia
passar a noite de Natal falando de Jesus, rezando... Os filhos dela jamais vão
saber que, por causa da mãe, uma família inteira estava passando o Natal na
sombra, consumida pela doença, sem que a omissão do estado fosse denunciada. Ela foi até a direção da empresa para evitar
que a matéria fosse feita. Não bastava
ser preconceituosa, tinha que espalhar essa visão míope para os altos escalões.
Imagino essa mulher passando por Francisco de Assis na
rua. Será que ela teria coragem de
cruzar com ele na calçada? Ou
atravessaria correndo? Sim, os santos
são esses malucos que andam entre os leprosos, que pegam bichos na rua, que
ajudam a enxugar as lágrimas de um desconhecido na fila do ganha tempo...
Francisco hoje seria mais um maluco. Então, quando alguém entra na minha casa e vê
todas as imagens que tenho de São Francisco, geralmente me pergunta: “Nossa,
você é super devota dele, né?” Não. Não
é bem isso. Porque é mais do que isso.
São Francisco está na minha casa como estão as imagens das minhas
avós. Outro dia, me peguei chorando
enquanto falava sobre ele para uma amiga.
As mesmas lágrimas que me brotam nos olhos quando falo delas. Ele foi uma pessoa que esteve nesse mundo e
que me inspira, que me ensina, que me ajudou a ser quem eu sou... Exatamente
como as minhas avós. Não é
idolatria. É só um jeito de tê-los por
perto dos olhos.
Muitas são as pessoas que acham que São Francisco é o santo
dos animais porque ele sempre foi um ecologista, que soube amar toda forma de
vida deste planeta. Ele está sempre
entre bichos nas imagens. Há muitos anos,
estudo a vida dele tanto sob a perspectiva histórica quanto religiosa. Não preciso nem dizer também o quanto estudo
a vida dos animais. De repente,
reelaborei essa visão sobre São Francisco.
No nosso planeta, os animais vivem e persistem
exclusivamente pela caridade alheia. Materialmente,
vivem o presente. Os animais de rua conseguem
o sustento daquele dia. Escapam dos
perigos daquele dia. Quando caem doentes, só a bondade alheia pode
ampará-los. Os animais silvestres
habitam as manchas de vegetação que deixamos para eles, nadam por entre o lixo
que despejamos no mar. Das nossas decisões, boas ou ruins, dependem os destinos
deles.
Era assim que São Francisco vivia. Sem posses, sem acumulo,
sem poupança... Francisco de Assis vivia
do que recebia naquele dia. Para mim, é
por isso que ele se tornou o Santo dos Animais, porque ele soube o que é ser
um. Tanto por ocupar um lugar
marginalizado na sociedade quanto por sua filosofia de vida. Como os animais, ele vivia da misericórdia de
Deus.
Não estou dizendo que loucos são santos, que protetores
santos nem que quem ampara desconhecidos é santo... Mas acho que qualquer um
pode ser santo.
OBS: Liguei para
outra emissora de TV e a matéria com a família que tinha hanseníase foi feita
pela concorrência. As pessoas receberam
o tratamento adequado e somente um dos parentes não se recuperou completamente.
Eu pedi demissão, mudei de cidade e fui cuidar da vida.
Todos foram felizes para sempre. Sobre a repórter, eu não sei. Não aceitei o pedido de amizade dela no
facebook para evitar um episódio de sincericídio da minha parte.
Os textos são muito profundos e, com certeza falam e dizem muito do que pense e sente a autora, que pela vida até onde convivi sempre teve um incondicional amor pela vida, quer dos chamados humanos quanto dos amigos animais, daqueles que nos proporcionam uma amizade e uma confiança unicas, muito bom anos depois ver que aquilo que para muitos seria reflexo momentaneo, não era, e sim convicção de humanidade, é avida que segue e que continue plantando amor e consciencia na preservação do nossos companheiros de jornada!
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